28 de abr. de 2009

Mundos encantados

A CASA DA BRUXA [2000]

os doze anos, eu dirigi, atuei e fiz o cenário para uma peça de João e Maria. Como uma criança gulosa, eu comecei produzindo uma linda casinha para a bruxa, coberta com muitos doces, balas e biscoitos, do tamanho de um bolo. Mas o cenário era o interior da casa e a casinha de doces foi parar em cima da mesa, como uma armadilha para outras crianças gulosas como eu. Como diretora e roteirista da peça, eu tinha reescrito a estória tradicional, criando a explicação nonsense e paradoxal de que “as chuvas fortes tinham feito a casa encolher tanto que ela tinha corrido para dentro de si mesma para que finalmente pudesse parar de se molhar e de encolher."

A CASA DE BONECAS

Doze anos depois, eu fui a Londres pela primeira vez para mostrar minhas ilustrações de Alice no centenário de Lewis Carroll em Oxford. Naquela época eu estava obcecada com a questão da mudança de tamanho, sempre procurando por garrafas e biscoitos que poderiam ser as chaves para essas transformações. O tesouro mais precioso que eu encontrei naqueles dias estava dentro de um museu de brinquedos. Para começar quando eu entrei no museu eu senti que estava entrando numa caixa de brinquedos gigantesca, quando uma súbita aparição provocou um sentido ao mesmo tempo de delicadeza e abismo que dissolveu minha antiga imagem da caixa de brinquedos. Eu tinha encontrado uma pequena casa de bonecas dentro de um quarto de criança de uma outra casa de boneca. Ela era tão pequena e perfeita mas ao mesmo tempo era a guardiã de um segredo. Imediatamente a minha imaginação colocou dentro da casinha uma outra casa de bonecas e então outra e mais outra e assim sucessivamente. Então eu conclui que ao invés de uma caixa de brinquedos o próprio museu era uma enorme casa de bonecas. E assim num lapso de tempo a realidade desapareceu e ao invés de um programa turístico, eu tinha encontrado uma escada para o infinito.

MEU QUARTO

Meu quarto é meu lugar especial no mundo, um artifício da minha imaginação, parte uma caixa de brinquedos, parte uma casa de bonecas, um refúgio irresistível. Colecionando objetos eu construo um mundo em miniatura, onde as memórias da infância e as fantasias de uma caçadora do insólito são constantemente renovadas através de um olhar melancólico. Objetos são guardados por muito tempo, objetos são encontrados em lugares inesperados, objetos são descobertos em dias especiais ou em dias nem tão banais. Todos eles se transformam em tesouros na minha coleção de sonhos. Então na hora de dormir eu conto estórias para eles e imagino que eles irão acordar no meio da noite para viverem suas vidas secretas e quando eu acordar eles não terão conseguido voltar para seus lugares. Suas posições não são nunca fixadas, nem suas relações, nem suas articulações, sentidos ou significados. Mas eu tenho certeza de que todos eles sabem em seus corações que um dia podem ser convidados a abandonarem seus lugares no meu jogo das milmaravilhas e então participarem em uma construção alegórica num filme de animação ou em um livro ilustrado.


A CASINHA ENCANTADA

Dentro desse quarto você pode encontrar o exterior de meu mundo imaginário, uma casinha encantada. Então, em meu pesadelo, é impossível escapar do meu mundo dos sonhos porque se eu tentar sair do quarto, volto para dentro dele no meu mundo em miniatura. A casinha encantada é uma chave do tamanho e também uma armadilha terrível. A casinha é uma caixa preta, contendo um segredo, como um anel de Moebius. Eu tive então que tirar fotos do quarto e coloquei os slides dentro da casa, criando assim possíveis janelas e talvez possíveis saídas. Mas quando eu coloquei dentro da casinha uma imagem da própria casinha, eu comecei imediatamente a imaginar que dentro da outra casa tinha uma outra casinha, e mais outra, e assim sucessivamente até o infinito. Dessa forma, como meu quarto estava dentro da casinha, eu estava correndo o sério risco de ser sugada e capturada na espiral de imagens e me perder nesse labirinto de janelas até o infinito. Como eu poderia sair do meu quarto através da casinha e me livrar de suas armadilhas irresistíveis?


O FABULOSO DESTINO DE AMELIE POULAIN

Depois de encontar o tesouro de uma criança numa caixinha secreta, a vida de Amelie Poulain teve uma mudança repentina. Ela decidiu que se ela pudesse achar o dono daquele tesouro precioso, ela começaria a ajudar as pessoas a mudarem suas vidas e ela então começou a criar várias estratégias para isso. Um conto de fadas contemporâneo, essa é uma fábula sobre a necessidade das pessoas de saírem de suas conchas e se encontrarem com as outras. Amelie me ajudou também. Para superar minhas próprias armadilhas e acordar do meu país das Maravilhas particular, eu decidi levar comigo em minha mudança para a Inglaterra o meu quarto em miniatura, como colecionadora nômade. Então eu segui a estratégia do anão de Amelie, fazendo fotos da minha casinha em nosso destino fabuloso. E então partimos para Londres novamente, deixando o resto para trás.





Adriana Peliano, 35 anos, viajante.

Quero ser a Branca de Neve


uando eu era bem pequena era encantada pelo desenho da Branca de Neve do Walt Disney. Adorava vê-la cantando e estendendo os braços no ar para que pousassem lindos passarinhos. Queria tanto ser como ela... Tentava ficar amiga dos passarinhos mas eles sempre fugiam de mim. No sitio onde eu costumava passar as férias, era comum as pessoas me verem parada, com os braços estendidos, e quando chegavam perto iam logo espantando os mosquitos imundos pousados sobre minhas mãos. – “Não! Para! Eu quero ser como a Branca de Neve!”

Adriana Peliano, 35 anos, artista plástica.